Padre João Vitor Freitas dos Santos fala sobre sua trajetória e compartilha impressões acerca da igreja

Jovem recebeu o sacramento da ordem na última sexta-feira | Foto: Anna Precht
Primeiro taquariense a ser ordenado padre na Paróquia São José desde sua fundação, há mais de 250 anos, João Vitor Freitas dos Santos concedeu entrevista a “O Taquaryense”. O bate-papo foi publicado na seção “Primeira Pessoa” da última sexta-feira, 20, quando o jovem de 27 anos recebeu o sacramento da ordem em celebração que reuniu mais de mil pessoas na Igreja Matriz.
A seguir, o filho de Cássia Andreia e João Alexandre dos Santos fala sobre o “sim” ao chamado recebido de Deus, conta parte de sua trajetória vocacional, lembrando como tudo começou, e compartilha suas percepções acerca da igreja e da participação dos jovens nos movimentos católicos.
Ele também comenta a relação que mantém com sua família e a expectativa para 2020, quando assume como vigário paroquial da Catedral São João Batista, de Montenegro.
O que o levou a querer entrar na vida religiosa?
Quando eu era pequeno, nunca pensei em ser padre. Foi a partir de uma experiência num grupo de jovens no CLJ (Curso de Liderança Juvenil) aqui da Paróquia São José. Em novembro de 2007, eu fiz um retiro de três dias em Salvador do Sul, e essa experiência me abriu para a vida cristã e da paróquia. Até então, eu não tinha essa participação. Comecei a gostar da igreja, de estar ali. Os meus amigos passaram a ser os amigos do grupo de jovens, eu me envolvia com os retiros, os encontros em outras cidades. E, quando no ensino médio comecei a pensar em profissão, cheguei a pensar numa área que me permitisse estar na igreja, fazendo aquele trabalho de que eu já gostava. Então, aos poucos, foi me caindo a ficha de que Deus me chamava para esse ministério, para essa vocação. Com o tempo, comecei a conversar com os padres, a participar de encontros vocacionais, os chamados Kairós, e a pensar: será que isso não é para mim? Aí, em 2012, fiz um estágio na paróquia Imaculada Conceição, de Canoas. A partir disso, pensei que queria entrar para o seminário, viver essa experiência. Então, em 2013, ingressei no Seminário São João Batista, da Diocese de Montenegro, em Viamão. Desde lá, vim fazendo filosofia, teologia, e aí o discernimento foi ficando cada vez mais sério, até o “sim” definitivo.
A que você atribui o fato de que há poucos jovens procurando seguir a vida religiosa?
Antigamente, as famílias enviavam os jovens para estudar nos seminários. Então, havia um grande número de seminaristas. Mas, no final, quando era para ficar padre, a maioria não ficava. Hoje, nós temos menos jovens ingressando. Porém, a maioria deles chega ao final da formação. Na nossa diocese, que é pequena, há 30 paróquias, com 17 jovens no Seminário Maior, seis no Propedêutico e 12 no Seminário Menor. São 35 jovens que estão nesse caminho e querem ser padres. É uma mudança de época. O jovem que entra no seminário não o faz mais por interesse da família, porque precisa estudar, e sim porque fez uma experiência bonita de grupo de jovens, participou do encontro Kairós, gostou do seminário. Está lá por opção. Aparentemente, existem menos jovens nos seminários, mas os que estão lá chegaram com bastante consciência.
Como você vê a igreja na atualidade?
A igreja é uma instituição muito antiga, e nós vivemos uma mudança de época. Nos anos 60 e 70, ela tinha muita influência, e a sociedade, digamos assim, era cristã, existia um clima de cristandade. Hoje, a sociedade mudou, a igreja não tem mais essa influência. Inclusive, a igreja reduziu bastante. Ela ainda tem tradição, mas o seu impacto na sociedade é muito pouco. Ao mesmo tempo, as pessoas que estão participando da igreja, principalmente os jovens, estão porque realmente fazem uma opção por ela. Fazem uma experiência, gostam e estão lá por adesão, com consciência. Hoje, não temos mais grandes massas católicas. Porém, os que estão participando amam Cristo e a igreja e querem ali viver a comunidade. A igreja está se adaptando a esse novo jeito de ser, que, na minha opinião, é mais coerente. As pessoas estão buscando a igreja porque realmente querem participar, e não por tradição. É mais fácil os pais começarem a participar da igreja por causa dos filhos do que o contrário, como acontecia antigamente.
O que foi mais difícil na trajetória até aqui?
Em vista da vocação, preciso dizer alguns “nãos”. Sou bastante apegado à minha família. Então, as horas mais difíceis são quando tenho um evento familiar importante e preciso dizer “não vou” porque tenho um compromisso com a paróquia ou alguma atividade. Esses momentos são um pouco ruins, mas isso não me entristece nem me deixa dividido. Apenas sei que eles gostariam que eu estivesse lá, e eu também gostaria de estar, mas há momentos em que não posso participar. Sou consciente de que isso não é porque eu não quero estar com a minha família, não significa que sou indiferente, mas é uma consequência do meu “sim”. E as ausências serão mais frequentes depois da ordenação. Então, me dói um pouco, porque parece que existe um afastamento da família. Mas, na verdade, não. Sempre que puder, estarei com eles. No entanto, a prioridade é a vocação.
Quais as principais atribuições de um padre?
O padre tem uma responsabilidade com a igreja em primeiro lugar. Em tudo o que diz respeito à comunidade, o padre é chamado a participar, coordenar, ajudar, estimular e motivar o povo de Deus. Aquilo que Cristo fazia passou para os sacramentos da igreja, e quem administra esses sacramentos é o padre. Ou seja, ele tem essa função de fazer as vezes de Cristo na comunidade: batizar, celebrar missa, etc. Essa é a função geral, e isso se traduz em diversos serviços específicos, como atendimento do povo, confissões, visita aos doentes, bênção nas casas, organização e estímulo das pastorais. O padre não precisa fazer tudo. Ele tem que contar com muita gente e motivar essas pessoas. É aquele que está à frente, não no sentido de que manda, mas como grande motivador da comunidade.
Como você se sente sendo o primeiro padre taquariense ordenado no município?
Feliz e com uma grande responsabilidade. Em primeiro lugar, me sinto feliz por causa da vocação, do chamado de Deus que recebi, e quero corresponder a esse chamado. Estou feliz pela comunidade, porque o apoio e a alegria me motivam muito. Mas é também uma grande responsabilidade, porque as pessoas colocam a sua confiança, apostam na minha vocação. Então, diante de tudo isso, estou bastante feliz e me sentindo cada vez mais responsável por essa vocação. Quero corresponder a todo esse apoio e a todas as orações.
Qual o lema que você escolheu para a vida sacerdotal?
Tenho como lema uma inscrição tirada de um quadro com a imagem de Jesus Misericordioso: “Jesus, eu confio em vós”. Essa inscrição, que é uma oração, uma jaculatória, eu rezo todos os dias. Ela me inspira confiança na ação de Deus, nos momentos felizes e também nas dificuldades. Confiança na vontade de Deus, naquilo que ele quer e prepara para mim. Então, diante desse lema, me sinto motivado a confiar em Deus, na sua proteção e na sua assistência.
O que vem pela frente após a ordenação?
No próximo ano, vou ser o vigário paroquial de Montenegro, me somando ao padre Ercílio, que também é vigário, e ao pároco, padre Diego, da Paróquia São João Batista. Estou com bastante expectativa para essa missão. É um lugar que eu já conheço, por causa do CLJ, e pelo qual tenho muito carinho. Fiz muitas amizades lá. É uma paróquia muito ativa, que conta com vários atendimentos, pastorais e movimentos. Então, tem bastante trabalho. Fico na expectativa de estar servindo o povo de Deus, de começar o meu ministério lá, de entregar a minha vida. Por isso, o meu coração e a minha energia são de Montenegro no ano que vem.
Ótima entrevista Anna, que o João seja muito feliz nesta longa jornada.
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