Eleita em 1959 a primeira vereadora de Taquari, ela obteve mais de 500 votos

Maria Odila foi entrevistada por “O Taquaryense” na estreia do espaço “Primeira Pessoa” | Foto: Anna Precht
Única mulher a disputar a eleição no ano de 1959, Maria Odila da Silva Kern foi a primeira representante mulher na Câmara Municipal de Taquari, tendo obtido mais de 500 votos como candidata do Partido Libertador. Aos 90 anos, com problemas de saúde e sem enxergar muito bem, passa os dias em casa, principalmente em seu quarto. A memória está intacta, e o senso crítico, bem desenvolvido.
Professora de Português, foi casada com Miguel Kern, que era dono de uma olaria. Tiveram um filho, Valter Maria da Silva, que é militar; e um casal de netos, Valter Maria da Silva Filho e Isabele Grando Maria da Silva.
Na semana em que o município completou 170 anos, Maria Odila recebeu a reportagem de “O Taquaryense” para uma entrevista repleta de histórias, lembranças e opinião.
O que a levou querer entrar na política?
Eu nunca quis, fui “forçada” pela sociedade, que achava que eu tinha que ser. Falei que não queria, que nunca tinha pensado nisso. Mas eu era muito amiga da mocidade, professora de muitas turmas. Aí um grupo de uns 30 ou 40 rapazes e moças foi na minha casa. Eu morava na Rua Sete de Setembro, onde o Dr. Miguel tem consultório. Levaram doces e tortas, para fazer uma palestra longa. Eles não me convidaram, eu nem sabia o que eles queriam. Na outra noite, tinha um baile no Alvi-Negro, fomos eu e meu marido, e quando estávamos sentados à mesa veio aquela turma toda, fez uma roda e gritava “vereadora, vereadora!”. E eu na minha. O Vilmar Becker tomou a palavra. Ele trabalhava no banco do comércio naquele tempo e disse: “Estamos aqui para apresentar a dona Maria Odila como vereadora não só das mulheres, porque nós todos queremos ela. Precisamos de uma pessoa inteligente, aberta ao povo, que seja amiga de todos e que receba na sua casa aquele que bater à porta”. Eu não disse que sim nem que não, mas me senti candidata. Começaram a me visitar, um dia uma turma, outro dia outra. Velhos, novos… Começaram a fazer faixas e espalhar pelas ruas do município com os escritos “Maria Odila vereadora”. Eles acharam que eu já tinha dito que sim, mas eu não tinha. Só que aí eu não pude dizer que não, eles começaram a gastar comigo, com essas faixas, chapas. A gente foi conversando, e eu aceitei. Aí comecei a trabalhar, visitar Paverama, Tabaí, as comunidades do interior, os lugares mais afastados, para trazer as pessoas de lá. Eu dizia que eu não tinha intenção de ganhar dinheiro, que eu não ia cobrar nada, como de fato não cobrei nenhum tostão. Queria trabalhar, de graça, para minha comunidade. Quando chegou o dia da eleição, a rua dos bancos [Oswaldo Aranha] ficou cheia de mulheres, de um lado e outro, entregando chapas e gritando “Maria Odila, Maria Odila!”. Nunca imaginei os votos que ia fazer. Fiz tanto voto que elegi mais três junto comigo. Valeu todo o trabalho.
Como foi seu mandato?
Tive um único mandato, que foi voltado para o povo, nunca deixei de receber bem todas as pessoas que me procuravam. Mas o que eu podia fazer pelas mulheres que estavam sendo injustiçadas eu fiz. Destaco o aumento que propus para as professoras municipais, que ganhavam muito pouco na época. O mandato deu muito trabalho. Às vezes, era madrugada, e nós estávamos lá trabalhando, e isso não serviu. Eu era muito comodista, gostava de dormir cedo, gostava de fazer outras coisas na cidade e acabava não conseguindo.
O que representou ser a primeira vereadora de Taquari?
Sempre fui a mesma Maria Odila que era antes. Para mim, não fez diferença. Mas claro que me senti orgulhosa. Fui muito bem votada, não teve classe social que não votou em mim, e isso me deixou muito satisfeita. Vi que tinha bastante gente que gostava de mim.
Como você avalia a participação da mulher na política atualmente?
Muito fraca. Eu fui a primeira vereadora, mas se vê muito pouco movimento de mulher por aí. Acho que as mulheres deveriam se reunir mais para falar sobre política, sobre o que sua comunidade e seu município precisam, para que comecem a tornar realidade aquilo que desejam. Assistir às sessões da Câmara também é importante.
Quais as principais diferenças em Taquari da época em que foi vereadora para agora?
Não sou de Taquari, sou de Estrela, mas vim para cá com dois anos. Me afeiçoei e gosto muito deste povo, gente simples, boa e sincera. Acompanho o município hoje. Quando eu era vereadora, não tinha calçamento em praticamente nenhuma rua. Hoje, as ruas são calçadas, as casas são pintadas, as pessoas se vestem melhor, participam de tudo para o que são convidadas. Taquari se desenvolveu muito. A Lagoa, por exemplo, era um charco onde as lavadeiras lavavam roupa e hoje é o ponto turístico mais importante da cidade.